domingo, 15 de agosto de 2010

QUANDO O AMOR VOA PELA JANELA (Mauricio)

Vivemos tempos difíceis. Os sentimentos das pessoas estão sempre atrelados a diversos outros interesses. O romantismo desapareceu. As pessoas não se olham mais pelo que são, mas sim pelo que têm. Não se preocupam tanto se o que o outro sente está enraizado em confiança, sinceridade, amor, respeito ou carinho: o que importa é que o outro seja capaz de realizar os seus desejos mais mundanos, é a capacidade do outro de proporcionar mimos como jantares, presentes e viagens.
Ninguém pensa em viver romances sinceros e ingênuos, em crescer com o outro juntos como pessoas e como casal. Todos olham para o futuro, tentando adivinhar os benefícios materiais ou carnais que podem tirar do possível relacionamento. Mulheres espreitam patrimônios e currículos masculinos e em troca são tratadas como pedaços desmiolados de carne preenchendo calças de cintura baixa. Homens escolhem mulheres pelo rebolado exibido enquanto dançam funk e em troca são analisados pelo equipamento de som dos carros que dirigem. Eles querem fazer sexo no primeiro encontro, elas querem que os mesmos paguem a conta da noitada. Todos se tornaram mercenários do sexo, do dinheiro, do desejo e do amor.
Os romances se transformaram em mais uma forma de subir na vida. Frases como: “se o dinheiro sair pela porta, o amor sai pela janela” se tornaram verdade incontestável. Mas será?
Então pergunto: Onde foram parar as paqueras inocentes, as conversas desinteressadas, os namoros que brotaram de amizades incipientes ou da troca de olhares cúmplices? Quando se parou de dar valor aos arrepios causados pelos primeiros esbarrões de mãos que se tornam mãos atadas, ou às primeiras conversas em que dois parecem sozinhos mesmo em meio a uma multidão, ou ainda aos primeiros beijos que começam suavemente e desaguam num frenesi de lábios, línguas e dentes? Onde estão as paixões capazes de nos tirar o fôlego só de ouvir a voz de quem tanto desejamos?
Adolescentes se acostumaram a beijar garotas à força. O pega-pega virou um latifúndio de beijos vazios. Não existe mais aquela apreensão na iminência das bocas se tocarem, e muito menos qualquer conversa: é um pedido... e então já foi, lá estão eles esfregando os lábios ansiosamente e acabando com pressa, antes que apareça uma outra boca para beijar. Eles trocam beijos como goles de bebida, como se experimentassem sabores efêmeros dos quais logo se esquecerão. E eles se esquecem.
Todos nós, na correria do dia dia e sob o império dos meios de comunicação, da sociedade de consumo tão imediatista e influenciados até mesmo pelas telenovelas que pregam o vale tudo no que podemos chamar de guerras amorosas... todos esquecemos.
Esquecemos que relacionamentos são formas de nos completarmos não só fisica e materialmente, mas também, e principalmente, sentimentalmente. Esquecemos que romances são encontros espirituais que envolvem pessoas por vezes totalmente diferentes mas que forjam os mais maravilhosos elos encontrados entre os seres humanos. Esquecemos que as qualidades materialistas que hoje se procuram nos pares se tornaram facilitadores que podem ser bons a princípio, mas que criam mentiras que podem durar a vida inteira e, mais ainda, nos esquecemos que os verdadeiros e mais fortes elos são forjados na adversidade e na dificuldade, são construídos pelo carisma comum, pela descoberta da cumplicidade entre qualidades e defeitos mútuos, são criados por encontros físicos que misturam inesquecivelmente sexo e sentimento. Esquecemos que o amor acontece para perpetuar os vínculos gerados pela paixão e que, em essência, deveria ser um sentimento puro e desinteressado. Esquecemos que relacionamentos baseados em qualquer coisa que não sejam sentimentos verdadeiros e sinceros pagarão seu preço no futuro em desilusão, cobranças desequilíbrio e desrespeito. Esquecemos que o amor tem um sentido maior que ecoa pela vida e além dela, não se contendo em coisas, e sim em lembranças e pessoas e no que estas compartilham de mais íntimo, pessoal e belo.
Assim, não devemos deixar que todos os interesses simplistas e materialistas relacionados ao que meramente queremos, entrem pela porta do nosso coração, pois quando isso acontecer, aí sim, é que o amor, cedo ou tarde, voará pela janela.

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